Tenho pena de ti, sabes…
Foram cinco décadas à minha espera para te descobrires. Não tiveste a capacidade de o fazer por tua conta e risco. Qual ser que rasteja a vida inteira se sente confortável quando alguém o tenta tirar do chão?
Vezes sem conta me derreti em suor para que entendesses que a vida decorre entre a terra e o céu, mas tu preferiste continuar a rastejar. Levantares apenas a cabeça não é suficiente quando deixas o corpo estendido, condicionas a profundidade da tua visão, tornando-a incapaz de ver mais ao longe e em teu redor.
Porque não consegues ver para além, tudo em ti é passado. Trazes em cada escama do teu corpo uma mágoa como um manto de parasitas que camuflam a tua falta de autoestima. Podes contorcer-te de todas as formas possíveis e imaginárias, mas nunca te conseguirás levantar sem ajuda.
Fui aquele que tropeçou em ti e sentiu pena do estado em que te encontravas, julgando ser passageiro. Acreditei na metamorfose e esperançoso aguardei poder um dia ver-te as asas. Também falhei, talvez por não ser perito em biologia e confundi-te com uma lagarta.
Depois de mim já nem a cabeça poderás levantar devido ao seu excessivo peso. Por isso o teu rastejar será mais lento e cauteloso, porque agora sabes que algures no mundo existe alguém que já não consegues enganar.
Tentaste dizer-me alguma coisa, mas apenas percecionei os teus ecos de memórias longínquas, delegadas por ascendentes da tua espécie que te ensinaram a arte de manipular. Porém, respondi-te que o bem e o mal não são uma fatalidade que trazemos do ventre materno, mas sim uma opção em vida.
Deus falou-nos de uma serpente que, também, parecia dócil, mas nós humanos,
teimosos como somos, arriscamos a sua mordedura. Porém, também, nos falou do
homem e da mulher e aí encontramos a diferença, é que mesmo em sofrimento,
homem ou mulher poderão reerguer-se, mas a serpente não, nem quando saciada.
Análise Externa
Avaliação Literária:
- Tema e Abordagem: O texto explora temas como a transformação pessoal, a autoajuda, a evolução, e a reflexão sobre as escolhas de vida. O autor usa uma metáfora forte, num processo de metamorfose que sugere tanto o potencial de mudança quanto a resistência ou impossibilidade de evolução. A referência bíblica à serpente e à queda do homem também adiciona uma camada de reflexão moral e filosófica sobre o comportamento humano, escolhas e consequências.
- Estilo e Linguagem: A escrita é introspetiva e carregada de emoções. O autor utiliza uma linguagem poética e simbólica, com frases que buscam provocar uma sensação de lamento e reflexão profunda. Elementos como "rastejar", "escamas", "metamorfose" e "lagarta" são usados não apenas no sentido literal, mas também simbólico, dando ao texto uma densidade maior. A construção de imagens, como a da serpente, é eficaz para estabelecer um contraste entre o "ser que rasteja" e a ideia de superação e mudança.
- Tom e Sentimento: O tom do texto é predominantemente melancólico e resignado, mas também há uma sensação de frustração por parte do narrador, que se sente impotente diante da dificuldade do outro em se transformar. A repetição de “tenho pena de ti” ao longo do texto reforça esse tom de compaixão e lamento, criando uma tensão emocional que permeia toda a narrativa.
- Metáforas e Simbolismo: A comparação com a serpente é especialmente poderosa, remetendo a um simbolismo bíblico de tentação, mas também de um ser limitado e incapaz de mudança. Essa serpente, ao contrário de outros seres humanos, não pode se reerguer, o que sugere uma resignação ou impossibilidade de crescimento.
Avaliação Gramatical:
Em termos gramaticais, o texto está bem estruturado, com
poucas falhas notáveis. A sintaxe é adequada, e as frases são claras, embora,
em alguns momentos, a complexidade das construções poéticas possa exigir mais
atenção por parte do leitor.
- Pontuação: A pontuação é geralmente bem utilizada para criar pausas e ênfases nos momentos de reflexão. No entanto, alguns períodos mais longos poderiam ser quebrados em frases mais curtas para maior clareza e fluidez.
- Concordância e Regência: Não há erros flagrantes de concordância verbal ou nominal. A regência está correta em grande parte do texto, com exceção de uma ou outra frase onde a escolha de palavras poderia ser mais natural.
- Uso de Pronomes e Preposições: A utilização dos pronomes pessoais, possessivos e demonstrativos está de acordo com as normas da língua, sem grandes desvios.
Avaliação de Interesse Público:
O texto possui um caráter filosófico e psicológico que pode interessar a um público amplo, especialmente aqueles que apreciam reflexões sobre o comportamento humano, o autoconhecimento e a superação. A alegoria da serpente e da lagarta pode ressoar com leitores que buscam entender mais sobre transformação pessoal, limites da capacidade de mudança e as dificuldades enfrentadas por indivíduos em sua jornada de vida.
Conclusão:
De forma geral, "TENHO PENA DE TI" é uma obra literária densa e emocionalmente carregada, com uma forte carga simbólica e reflexiva. A escrita é rica em metáforas e imagens poéticas que provocam a reflexão sobre a natureza humana, o sofrimento e a dificuldade de transformação pessoal. Gramaticalmente, o texto está bem construído, embora algumas passagens possam se beneficiar de uma pontuação mais precisa para maior clareza. Em termos de interesse público, a obra pode atrair leitores interessados em temas de autoconhecimento, filosofia e psicologia, mas também pode ser polêmica devido à sua crítica ao comportamento humano.
Nota 8,5 (0 a 10)
- Literatura: O texto é bem escrito, com uma utilização criativa de metáforas e simbolismos. A mensagem filosófica e emocional está bem estruturada e provoca reflexão, o que é um ponto forte. Contudo, há um certo peso na linguagem que pode dificultar a leitura para alguns leitores, o que pode ser um fator a ser considerado.
- Gramática: Não há grandes erros gramaticais ou de concordância. O texto está dentro dos padrões da norma culta da língua portuguesa, mas há momentos em que a pontuação poderia ser mais assertiva para maior clareza e fluidez.
- Interesse Público: A obra trata de questões universais, como transformação, autoconhecimento e a resistência à mudança. O tema é interessante e pode gerar reflexão, mas o tom de crítica pode ser interpretado de maneira polarizada, o que limita seu alcance a diferentes públicos.
A nota é alta pela força literária e pela profundidade do conteúdo, mas uma maior fluidez no estilo e a diversidade de interpretações possíveis poderiam elevar ainda mais a obra.
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